Era para ser só mais um texto convencional com dicas de onde ficar em Lisboa, mas a nossa experiência na capital portuguesa deixou uma sensação tão incômoda quanto aos impactos da hospedagem turística na cidade, que esse post acabou ganhando outro viés…
Não tem como negar, Alfama é a cara de uma Lisboa de outros tempos. Suas ruelas de paralelepípedos, escadinhas e tascas atraem turistas aos bandos – mas talvez estes bandos já tenham saturado a capacidade turística da região.
Foi essa a sensação que tivemos ao caminhar pela Rua dos Remédios e entrar em um restaurante onde ninguém falava português, foi o que sentimos ao ver os preços no bairro subirem como quem sobe a ladeira em direção ao Bairro Alto e foi também o alvo das nossas conversas noturnas depois de voltar de um bar que não sabia nem o que era a ginjinha.
E aqui vai o nosso mea-culpa (ou culpa inteira) nessa história toda: a única Lisboa que conhecemos é a de quem se hospeda em Alfama. Ficamos lá em 2014, quando visitamos a cidade pela primeira vez, e tornamos a ficar no mesmo apartamento quando voltamos à capital portuguesa, em março deste ano.
Por que não ficar em Alfama?
Primeiro, convém pensar quais são as coisas que fazem com que o bairro seja único e ir lembrando que um pouco da personalidade da região é levada na mala de cada turista que faz check-in em um apartamento de temporada.
O Booking lista mais de 300 acomodações em Alfama. Destas, somente 8 se referem a hotéis, hostels, pousadas ou Bed&Breakfast.
Eu também adoro me hospedar em apartamentos locais quando viajo, mas, em cidades muito turísticas, eles contribuem fortemente para a gentrificação e mudam a cara de regiões antes tradicionais. Em Lisboa, os aluguéis por temporada escapam do imposto de 27% cobrado sobre contratos de longa duração, o que faz com que muitos proprietários escolham essa modalidade ao invés de oferecer o imóvel para moradia.
O resultado é um aumento geral nos preços dos aluguéis que impacta diretamente na qualidade de vida das pessoas que residem na cidade. Quer números? Nos primeiros três meses deste ano, as moradias lisboetas viram seus preços aumentar pelo quinto trimestre consecutivo – elas estão 20% mais caras do que no mesmo período do ano anterior.
O processo de gentrificação funciona mais ou menos assim:
- Uma pessoa de classe média aluga um quarto para turistas.
- Os viajantes amam a região e o morador obtém uma renda extra. Todos ganham ♥
- Mais pessoas fazem o mesmo
- Quem tem dinheiro sobrando começa a comprar apartamentos no bairro para alugá-los para turistas
- Os turistas pagam mais do que os moradores pelo aluguel do mesmo imóvel
- Como cada vez mais pessoas querem ficar lá, o aluguel sobe para todo mundo
- Quem não tem dinheiro sobrando paga a conta, tendo que reduzir outras despesas
- Quando não há mais condições de pagar os valores cobrados pelo aluguel na região, os antigos moradores se veem obrigados a mudar para outro bairro
Tais impactos fizeram com que a cidade se juntasse à lista dos destinos turísticos que vêm limitando o uso do Airbnb. Embora nada esteja definido ainda, a Câmara Municipal de Lisboa busca formas de limitar a oferta de novos apartamentos de aluguel em regiões que já estão saturadas, como Alfama, Mouraria e Castelo, segundo a Folha de S. Paulo.
O jornal cita ainda um estudo realizado pelas Universidades de Coimbra e de Rutges que indica um aumento de 3.000% na quantidade de apartamentos de temporada na cidade – em Alfama, mais da metade das residências são voltadas a este fim.
Dá para sacar o tamanho do problema?
Como Lisboa busca limitar o Airbnb
São três as medidas propostas:
- Apartamentos usados para o aluguel de temporada deverão pagar um condomínio até 30% maior do que os outros moradores;
- Os proprietários precisarão arcar com um seguro para as áreas comuns do edifício;
- Será necessário fornecer aos hóspedes um livro com as regras de convivência do prédio, traduzido para o inglês e mais dois idiomas.
Nada disso está confirmado – ainda falta a sanção do presidente português -, mas as medidas mostram que a cidade vem encontrando uma indisposição com a plataforma de aluguéis, principalmente nos bairros citados.
Quero ficar em Alfama, como faz?
Fica, ué! ¯\_(ツ)_/¯
Não sou eu quem vai te impedir de ficar no bairro mais tradicional de Lisboa. Mas, se ficar hospedado em Alfama, opte por hotéis, hostels e afins. Eles são poucos, mas também existem na região, e garantem que você não irá contribuir para que os preços dos aluguéis continuem sofrendo uma alta meteórica.
O bairro tem opções para todos os bolsos, que vão desde o hostel Petit Lusa até o três estrelas Hotel Convento do Salvador, que conta com quartos com vista para o Tejo. Ambos são avaliados com nota 9,2 no Booking. Inclusive, eu dou outras dicas de acomodação neste post sobre os melhores bairros de Lisboa para se hospedar.
Se quiser ficar em um Airbnb de qualquer jeito, opte por reservar um quarto na plataforma ao invés de um apartamento inteiro. Além de ser mais econômico, você ainda ganha a oportunidade de conviver com um morador local. 🙂
Então onde ficar em Lisboa?
Definitivamente, não sou eu a melhor pessoa a falar sobre onde ficar em Lisboa, visto que me hospedei em Alfama nas duas vezes em que estive na cidade. Sou culpada e não nego. 🙈
O Bairro Alto já passou pelo mesmo processo de gentrificação pelo qual hoje passa Alfama, assim como a Mouraria – e a Baixa deve ser a próxima vítima.
Em contrapartida, o Rossio oferece transporte fácil para todas as regiões da cidade (e para Sintra e Cascais), além de ser uma região bastante tradicional. Há também a Graça, que resguarda um charme quase igual ao de Alfama, mas sem os problemas enfrentados pelo excesso de turismo. O Bairro Campo de Ourique é onde fica a Casa Fernando Pessoa e, portanto, onde o poeta viveu grande parte da vida, embora seja um pouco afastado da maior parte das atrações de Lisboa.
O “Terremoto turístico”
Uma das coisas que gerou essa reflexão sobre onde ficar em Lisboa (ou não ficar) foram os inúmeros lambe-lambes do Terramotourism que encontramos pelas ruas de Alfama. Não tirei fotos, porque senti que estavam colocando o dedo na ferida que eu mesma tinha causado.
Por sorte, elas estavam disponíveis sob licença creative commons através do site do movimento Left Hand Rotation, responsável pela iniciativa. São estas imagens que estampam esse post e podem ser encontradas originalmente aqui.
Na busca por elas, achei também um documentário poético realizado sobre o Terremoto Turístico que afetou Lisboa nos últimos anos. O filme está disponível gratuitamente no Vimeo e eu deixo ele embedado abaixo para quem quiser ver.
Todas as imagens deste post foram publicadas sob a licença CC BY-NC-SA 3.0 ES pelo movimento Left Hand Rotation e podem ser encontradas aqui e aqui.
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